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domingo, 18 de agosto de 2013

Ex-detentos contam como opera a corrupção no sistema prisional

http://tnh1.ne10.uol.com.br/noticia/maceio/2013/08/18/259973/ex-detentos-contam-como-opera-a-corrupcao-no-sistema-prisional

Venda de 'privilégios' é comum, diz juiz de Execuções Penais; presidente do Conseg sugere mudança radical de agentes

Da Redação
Celulares apreendidos no Sistema Prisional de Alagoas (Crédito: TNH1)
Celulares apreendidos no Sistema Prisional de Alagoas (Crédito: TNH1)
O uso de celulares dentro dos presídios alagoanos não é novidade. Ano passado, mais de 2.500 foram apreendidos e destruídos pela Justiça. Apesar do rigor nas revistas a familiares de presos, a quantidade de aparelhos já apreendidos indica que o número pode ser ainda maior este ano e, conforme denúncias, esteja diretamente ligado à corrupção dentro do sistema prisional.
Celulares, drogas, armas e uma variedade de aparelhos eletrônicos "fazem a festa" dos detentos e facilitam o comando de quadrilhas criminosas e a prática de delitos de dentro dos módulos. De acordo com o relato de dois ex-detentos alagoanos ao TNH1, a entrada do material é, na maioria dos casos, providenciada pela própria administração penitenciária.
Comprar um aparelho dentro do presídio pode ser fácil, mas não é barato. Segundo um profissional autônomo que ficou detido quatro meses no Cadeião em 2012, o celular mais simples, do modelo conhecido como “lanterninha”, custa R$ 2 mil. E quase toda a população carcerária tinha um.
A venda, segundo ele, é efetuada pelo próprio preso em conluio com agentes penitenciários. “Só os ‘cabeça’ lá dentro vendiam. Eles ficavam com R$ 1 mil e o agente, que trazia o aparelho, com outros R$ 1 mil. Muitas vezes deixavam os celulares com os ‘sem convivência’, os ‘tarados’, que ficavam numa área longe. No meio da noite, eles saiam batendo nas celas pra fazer a entrega”, contou.
Questionado como um detento teria condições de pagar preços tão altos, a fonte do TNH1 disse que o dinheiro vem do tráfico de drogas, que “come solto” dentro do presídio. O presidente do Sindicato dos Agentes Penitenciários de Alagoas, Jarbas Sousa, reconhece que existe corrupção, mas diz que estes valores estão “superfaturados”.
“Isto é mentira, não existe. Os presos são miseráveis, não têm condições de pagar tão caro. Já recebemos denúncias de um detento que comprou um celular por R$ 200 a um advogado. Há informações que levam a crer que a corrupção existe, mas nós reprovamos esta postura e esperamos a punição dos servidores que forem flagrados cometendo isso”, afirma Jarbas.
Facas apreendidas em presídio alagoano
Agentes são corruptos, dizem ex-detentos
Nos 123 dias de experiência no Cadeião, o profissional autônomo, preso após cometer um roubo, disse ter observado que não havia um único agente penitenciário “sério”. “Todo mundo ali estava envolvido. Mas o diretor, um homem gordo que eu vi poucas vezes, era rígido e até onde eu saiba não participava do que acontecia”, comentou.
"Agentes penitenciários, diretores. Praticamente não há nenhum incorruptível", conta um jovem ouvido pela reportagem que, por questões de segurança, prefere não ter o nome divulgado. Ele ficou poucos dias detido na área da triagem do Baldomero Cavalcanti, tempo suficiente para entender como funcionava o esquema liderado por facções criminosas e se surpreender com as regalias garantidas, segundo ele, por agentes penitenciários.
A denúncia dá conta de que tudo pode ser comprado ou negociado de dentro do Sistema Prisional. Em cada módulo, de acordo com o jovem, havia dois líderes, que possuíam armas. Os demais reeducandos eram beneficiados com eletrônicos, drogas e no mínimo um celular para cada alojado na triagem - local onde os novos presos deveriam permanecer por apenas 30 dias, mas que tem abrigado um alto número de detentos devido à superlotação no presídio.  
Apesar de grave, a denúncia não impressiona o juiz da Vara de Execuções Penais, José Braga Neto. Ele reconhece que, por algum tempo, um grupo de detentos perigosos ficou encarcerado na triagem e cometia uma série de abusos, incluindo a cobrança de "pedágio" a quem passava pelo local. "Por isso mesmo, doze pessoas foram transferidas ao presídio de Segurança Máxima", disse.

De acordo com Braga Neto, a área da triagem era ocupada por presidiários que eram “odiados” pelos demais porque ajudavam os fiscais nas revistas às celas - prática hoje proibida pela Justiça. Esta aproximação com os agentes, segundo o juiz, conferiu "privilégio dentro do sistema em relação à administração da unidade".


“Existe uma revista muito rigorosa no familiar dos presos e, mesmo assim, eles conseguem entrar com alguma coisa. Mas eu não acredito que toda essa gama de telefone, essa quantidade impressionante, entra através dos familiares. Lógico que deve estar existindo favorecimento. Seria leviano dizer quem estaria fazendo isso, pois há funcionários de bem, como pode haver aqueles que querem o pior e trazem prejuízo significativos ao sistema prisional”, comentou Braga Neto.

Sgap defende que casos são isolados
O superintendente Geral de Administração Penitenciária, tenente-coronel Carlos Luna, defende que os casos de corrupção dentro do Sistema Prisional são isolados. Ele reconhece que servidores já foram presos por envolvimento em crimes, como facilitação de fuga e entrada de arma, drogas e celulares. “Mas isso não é comum, se a maioria fosse corrupta, o sistema já nem existiria. Não daria para controlar”, frisa.
No entanto, Luna observa que há 300 processos em andamento na Corregedoria para apurar denúncias - com destaque para corrupção e maus tratos - recebidas pela superitendência. "A maioria acaba sendo arquivada por falta de provas. Mas recebemos muitas denúncias", relata.
Diante deste cenário, como medida para impedir o uso de eletrônicos e outros materiais nos presídios, a Sgap frisa que as visitas têm sido revistadas com mais rigor. “Isso causa filas, irrita os familiares, mas é o que podemos fazer e tem produzido um efeito positivo muito grande”, completa.
Corrupção já chegou ao novo Módulo de Segurança Máxima, diz Conseg
A atuação de organizações criminosas no Sistema Prisional de Alagoas tem preocupado o Conselho Estadual de Segurança (Conseg). Em reunião do colegiado na última segunda-feira (12), o presidente, juiz Maurício Brêda, disse que celulares estão sendo vendidos por R$ 3 mil e R$ 5 mil no novo Módulo de Segurança Máxima, ampliado e reformado no ano passado.
“Por causa da corrupção, não se consegue ‘segurar’ sequer um presídio com pouco mais de cem pessoas. Toda a equipe [de agentes] tinha que ser deslocada para outra cidade. Sabemos que este tipo de coisa acontece em todo país, mas aqui em Alagoas o negócio é sério”, afirmou Breda, antes de uma reunião a portas fechadas com a administração do sistema penitenciário.
A Divisão Especial de Investigação e Capturas (Deic) diz que tem investigado quadrilhas que atuam dentro dos presídios. A delegada Ana Luiza Nogueira lembra que, ano passado, foram presos três agentes penitenciários que integravam uma quadrilha que vendia privilégios a detentos por preço tabelado.
Dário César: "falta de provas dificulta investigação"
O secretário de Estado da Defesa Social, coronel Dário César, afirma não compactuar com atos equivocados de nenhum servidor. Para ele, a denúncia do TNH1 enseja a abertura de uma investigação no Sistema Prisional.  
Situação é inadmissível, diz Dário César
"Toda denúncia contra irregularidades merece ser apurada. O problema é que, muitasvezes, a denúncia é vazia, não é dirigida a uma pessoa. Peço às pessoas que forneçam o máximo de informações, com riqueza de detalhes, ao disque denúncia (181). Assim é possível fazer uma apuração precisa, e separar o joio do trigo, os profissionais bons daqueles que maculam o trabalho dos comprometidos". 
Dário classifica como inadimissível a prática de crimes de dentro dos presídios, mas lembra que esta situação ocorre em todo Brasil. O secretário, que já esteve à frente da Sgap em 2009, diz nunca ter flagrado uma arma na posse de presos. "Outros materiais ilícitos sim", acrescenta.  
De acordo com o secretário, agentes públicos que usam sua função para afrontar a lei merecem ser punidos. "Não podemos deixar que uma pequena minoria suje a imagem da categoria", frisa.
Sindapen culpa superlotação e baixo efetivo
Para o Sindicato dos Agentes Penitenciários é impossível garantir a segurança e proibição de materiais ilícitos dentro dos presídios devido à superlotação e o baixo número de servidores. “São quatro ou cinco agentes para vigiar 800 detentos. Semana passada, tivemos notícias de presos ajudando a revistar os próprios detentos. O que de bom pode sair dessa relação?”, pontua Jarbas.
O presidente do Sindapen ainda sustenta que há pessoas que tentam fixar uma imagem negativa dos agentes. “Se os aparelhos fossem vendidos dessa forma, muitos já estariam ricos. Os que têm um bom padrão de vida vêm de famílias estruturadas, ou exercem outras atividades extras. Como em toda categoria, há profissionais bons e ruins”, comenta.

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